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Infeção por Helicobacter pylori: uma nova abordagem da doença


Dr. Nuno Almeida | Gastrenterologia

Hospitais da Universidade de Coimbra


A bactéria Helicobacter pylori (H. pylori), inicialmente denominada Campylobacter pyloridis, foi identificada por Barry Marshall e Robin Warren em 1982. Desde então têm-se publicado múltiplos artigos sobre este microrganismo, que acomete 4,4 biliões de indivíduos a nível mundial. Esta bactéria é considerada um agente carcinogénico tipo I pela OMS desde 1994, sendo responsável por 75 a 89% dos casos de adenocarcinoma gástrico não-cárdico ocorridos anualmente.

Desde muito cedo procurou-se congregar a principal informação relativa ao diagnóstico e tratamento da infeção nos chamados consensos de Maastricht, sendo os primeiros publicados em 1997. A quinta edição, tendo como primeiro autor o Professor Peter Malfertheiner, data de 2017, e apresentou-nos alguns conceitos novos relativamente a esta patologia, reforçando outros pré-existentes.

Conforme previamente citado, a bactéria H. pylori é o principal agente etiológico do adenocarcinoma gástrico, mas este gérmen contribui também para o desenvolvimento de úlcera péptica em 10 a 20% dos infetados, assim como linfoma MALT gástrico em 0,1%.

Durante largos anos debateu-se o interesse de promover a erradicação desta bactéria em indivíduos assintomáticos e sem alterações endoscópicas e/ou analíticas. Ora, a primeira afirmação dos consensos supracitados é, precisamente, que a gastrite por H. pylori é uma doença infeciosa, independentemente dos sintomas e complicações. Isto implica que o tratamento deve ser proposto a todos os infetados. Obviamente que este processo requer senso clínico e os doentes devem ser cuidadosamente informados sobre os esquemas terapêuticos disponíveis, as respetivas taxas de eficácia, efeitos adversos, interações e a suma importância da adesão à terapêutica.

Outra das recomendações importantes deste documento é a estratégia de testar e erradicar H. pylori em doentes com dispepsia não investigada, desde que os mesmos não apresentem sinais/sintomas de alarme (perda de peso, disfagia, anemia, emagrecimento significativo, hemorragia gastrointestinal evidente) ou pertençam a grupos de risco acrescido, seja pela idade ou história familiar. O teste respiratório com ureia marcada por 13C (ou por 14C) é o teste não invasivo melhor estudado neste contexto, sendo imprescindível suspender os inibidores da bomba de protões nas 2 semanas que o antecedem, assim como os antibióticos e os compostos com bismuto nas 4 semanas anteriores.

Adicionalmente, o painel de peritos assume que as taxas de resistência de H. pylori aos antibióticos estão a aumentar na maioria das regiões, e que a terapêutica empírica tripla baseada na claritromicina deve ser abandonada nos locais onde a resistência desta bactéria aos macrólidos é superior a 15%. Embora não seja referido o caso específico de Portugal existem múltiplos dados na literatura que suportam este evento crítico no nosso país. Deste modo, seguindo o exposto nas recomendações em apreço, devemos recorrer a esquemas quádruplos com ou sem bismuto, contendo estes últimos o inibidor da bomba de protões, a amoxicilina, a claritromicina e um nitroimidazólico (por norma o metronidazol).

Por último, a eficácia de qualquer regime terapêutico deve ser sempre avaliada a posteriori, com recurso preferencial a métodos não invasivos de pesquisa de H. pylori como o teste respiratório ou a pesquisa de antigénios fecais. Só em situações excecionais, em que a realização da endoscopia digestiva alta está formalmente indicada, é que se recorre a esta técnica com colheita de biopsias.