Qual o papel das benzodiazepinas no tratamento da depressão?
A depressão é uma doença psiquiátrica complexa cuja abordagem terapêutica deve ser sempre individualizada1.
O seu tratamento inclui intervenções psicológicas e farmacológicas, sendo que os medicamentos antidepressivos assumem um papel fundamental (Tabela 1).
Classe/Mecanismos de acção | Antidepressivos | Doses Terapêuticas |
Antagonistas da Serotonina 5HT2/Antagonistas dos Receptores Alfa-2 (NaSSa) |
Mirtazapina Mianserina |
15-45 mg 30-90 mg |
Inibidores da Recaptação da Noradrenalina e da Dopamina (NDRIs) | Bupropiom | 150-300 mg |
Antagonistas da Serotonina 5HT2/Agonistas MT1 e MT2 | Agomelatina | 25-50 mg |
Antagonistas da Serotonina 5HT2/Inibidores da Recaptação da Serotonina (SARIs) | Trazodona | 150-300 mg |
Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina (SSRIs) |
Citalopram Escitalopram Fluoxetina Fluvoxamina Paroxetina Sertralina |
20-40 mg 10-20 mg 20-40 mg 50-100 mg 20-40 mg 50-100 mg |
Inibidores da Recaptação da Serotonina/ Agonistas da Serotonina 5HT1A/ Agonistas parciais 5HT1B/Antagonista 5HT1D, 5HT3A, 5HT7 | Vortioxetina | 10-20 mg |
Inibidores da Recaptação da Serotonina e da Noradrenalina (SNRIs) |
Duloxetina Venlafaxina |
30-60 mg 75-225 mg |
Embora os antidepressivos da classe dos Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina (SSRIs) sejam, de facto, os fármacos mais prescritos no tratamento da depressão, as guidelines internacionais preconizam também como tratamento de primeira linha outros antidepressivos igualmente eficazes: agomelatina, bupropiom, venlafaxina, duloxetina, mirtazapina e vortioxetina1.
Na clínica, é prática frequente a prescrição simultânea de uma benzodiazepina com o fármaco antidepressivo no tratamento das perturbações depressivas, sobretudo nas situações em que o paciente apresenta concomitantemente sintomas ansiosos ou perturbações do sono. O próprio tratamento com fármacos antidepressivos sobretudo os da classe dos SSRIs pode condicionar também alguma sintomatologia ansiosa na fase inicial do tratamento2,3.
No entanto, não são desprovidas de efeitos secundários, particularmente as alterações cognitivas, a sedação, o risco de quedas e acidentes. Adicionalmente, os fenómenos de tolerância, dependência e abuso são também aspetos relevantes a considerar4.
Os estudos internacionais referem que a utilização de benzodiazepinas tem papel limitado no tratamento da depressão e não é recomendada em monoterapia, embora possam ser prescritas como terapia adjuvante de curto prazo3. Ao contrário dos antidepressivos cujo tratamento deve ser realizado durante 6 a 9 meses1, o uso prolongado de benzodiazepinas em pacientes com depressão não apresenta evidência sustentada na literatura2,4.
Uma das grandes dificuldades na prática clínica é a descontinuação de benzodiazepinas que culmina com uma realidade preocupante associada ao facto de muitos pacientes se manterem medicados com benzodiazepinas a longo prazo2.
Assim, no caso das perturbações depressivas, a avaliação do risco-benefício de associar uma benzodiazepina deve ser cuidadosamente ponderada e caso a caso2.
Nas situações de depressão com sintomas ansiosos pode-se associar em SOS uma benzodiazepina com propriedades ansiolíticas (alprazolam, por exemplo) de forma a que o paciente recorra a este fármaco só em situações excepcionais e não diariamente.
No caso das perturbações do sono, se estas forem graves e/ou incapacitantes pode-se associar fármacos hipnóticos não benzodiazepínicos. Alternativas como melatonina, trazodona ou mirtazapina em doses baixas devem ser priorizadas, recorrendo apenas a benzodiazepinas como segunda linha de tratamento.
Bibliografia e referências:
- Kennedy SH, Lam RW, McIntyre RS, Tourjman SV, Bhat V, Blier P, et al. Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) 2016 Clinical Guidelines for the Management of Adults with Major Depressive Disorder: Section 3. Pharmacological Treatments. Can J Psychiatry. 2016 Sep;61(9):540-60. Erratum in: Can J Psychiatry. 2017 May;62(5):356.
- Bushnell GA, Stürmer T, Gaynes BN, Pate V, Miller M. Simultaneous Antidepressant and Benzodiazepine New Use and Subsequent Long-term Benzodiazepine Use in Adults With Depression, United States, 2001-2014. JAMA Psychiatry. 2017 Jul 1;74(7):747-755.
- Davidson JR. Major depressive disorder treatment guidelines in America and Europe. J Clin Psychiatry. 2010;71 Suppl E1:e04.
- Lader M. Benzodiazepines revisited--will we ever learn? Addiction. 2011 Dec;106(12):2086-109.