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As Guidelines de abordagem e tratamento da fibrilação auricular


Dr. Ricardo Fontes Carvalho | Cardiologia

Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, Espinho


A Sociedade Europeia de Cardiologia publicou as suas recomendações sobre a abordagem e tratamento dos doentes com fibrilação auricular (FA). A este propósito sabemos que a fibrilação auricular é a arritmia cardíaca mais frequente e continua a aumentar de prevalência, afetando já cerca de 3% da população adulta europeia. Sabemos que 1 em cada 4 adultos vão desenvolver fibrilação auricular ao longo da vida e que a fibrilação auricular está associada a um aumento do risco de AVC, de hospitalização, de declínio cognitivo e aumenta em cerca de duas vezes o risco de mortalidade.

Dado o impacto clínico da fibrilação auricular, importa sublinhar os principais pontos destas novas recomendações:

1) Reforço do nível de recomendação para se efetuar o “rastreio da fibrilação auricular

A fibrilação auricular é muitas vezes uma doença assintomática, sobretudo no idoso. Por isso, a primeira manifestação clínica da fibrilação auricular é frequentemente um AVC. Atendendo a este problema, estas novas guidelines reforçam a recomendação para realização por rotina da avaliação do pulso em todas as consultas dos indivíduos com mais de 65 anos. Se o pulso for arrítmico, recomenda-se a realização de um electrocardiograma para avaliação do ritmo do doente. Esta é uma medida muito simples e que salva vidas.

2) Necessidade de uma abordagem multidisciplinar da fibrilação auricular

A fibrilação auricular está frequentemente associada a outras comorbilidades, nomeadamente a hipertensão arterial, a diabetes, a obesidade ou a apneia do sono. O tratamento moderno da fibrilação auricular envolve o tratamento destas doenças associadas. Por exemplo, a redução significativa do peso e o tratamento da apneia do sono são duas medidas que permitem uma redução significativa da probabilidade de recorrência da fibrilação auricular. Desta forma, estas novas guidelines introduzem a necessidade do conceito de “Heart Team” no tratamento da fibrilação auricular. Na prática isto traduz-se na constituição de equipas multidisciplinares para uma abordagem holística dos casos mais complexos de doentes com fibrilação auricular. Além disso, é importante envolver o doente em todo o processo de decisão clínica da fibrilação auricular.

3) Novas recomendações sobre a hipocoagulação do doente com fibrilação auricular

No doente com fibrilação auricular, a hipocoagulação é a principal medida que altera o prognóstico do doente, prevenindo a grande maioria dos AVCs e prolongando a vida do doente. O benefício clínico desta terapêutica é praticamente universal, com exceção dos doentes com CHADSVASC = 0. Nestes doentes com score de 0, não é recomendado nenhum tratamento antitrombótico, nem mesmo a aspirina. Aliás, a aspirina deixa de ser aconselhada, em praticamente nenhum cenário, para prevenção do AVC associado à fibrilação auricular.

4) Reforço das recomendações para a utilização dos NOACs como terapêutica de primeira linha para a prevenção do AVC associado à fibrilação auricular

Os novos anticoagulantes (NOACs) provaram ser uma terapêutica mais “confortável” para o médico e para o doente. Contudo, ao longo destes anos a evidência dos ensaios clínicos, mas também dos registos do mundo real, mostraram claramente que, além de ser mais confortável, é uma terapêutica que reduz eventos relativamente à varfarina. A título de exemplo, o estudo ARISTOTLE mostrou que, comparativamente à varfarina, o apixaban reduziu o risco de AVC/embolismo sistémico em 21%, a hemorragia major em 31% e, mais importante, a mortalidade total em 11%.

Atendendo à consistência destas evidências as novas recomendações dizem que na hipocoagulação do doente com fibrilação auricular, “um NOAC é recomendado preferencialmente a um antagonista da vitamina K”. Esta é uma recomendação de classe IA, ou seja, recebe o mais forte nível de evidência das guidelines.

Podemos assim concluir que o “gold-standard” de hipocoagulação na fibrilação auricular é a utilização de NOACs.