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Quais são as diferenças entre a dor aguda e a dor crónica?


Dr. João Lagoas Gomes | Reumatologia

Hospital Lusíadas Lisboa, Lisboa


A dor está descrita como uma experiência sensorial e emocional desagradável, que está ou parece estar relacionada com dano tecidular ou potencial dano tecidular. Esta descrição, aceite internacionalmente1 salienta a subjetividade inerente ao fenómeno doloroso. A dor é multidimensional, sendo influenciada não apenas por características anatómicas e fisiológicas, mas também por aspetos emocionais e sociais. É, portanto, um fenómeno pessoal e intransmissível, necessitando de uma abordagem centrada no doente e multidisciplinar.

A diferença entre dor aguda e dor crónica vai muito para além da sua distribuição no tempo. Por um lado, a dor aguda é um fenómeno fisiológico normal e previsível, que serve como sistema de alerta para o nosso corpo, permitindo ao ser humano interagir com o meio envolvente de uma forma segura. Os doentes com síndromes de insensibilidade à dor raramente chegam à idade adulta. Ou seja, a dor aguda e autolimitada é indispensável á vida.

Pelo contrário, a dor crónica é desprovida de vantagem biológica. É um fenómeno imprevisível, que se mantem para além do estimulo que a causou e para além do tempo normal de regeneração dos tecidos. Geralmente, está associada a elevada morbilidade e incapacidade, representando um fardo significativo para a sociedade e para os sistemas de saúde.

O processo de transição da dor aguda para a dor crónica, denominado de cronificação da dor2, está associado a mecanismos de sensibilização central e periférica causadores de hiperexcitabilidade dos nociceptores e facilitação da propagação do potencial de ação a nível central. Estes fenómenos amplificam a duração, intensidade e distribuição espacial da dor.

Existem diversos fatores de risco identificados para a cronificação da dor3, nomeadamente: aspetos demográficos como o nível de educação, o género feminino ou a idade avançada; aspetos psicológicos como a ansiedade/stress, depressão, catastrofização ou crenças negativas; aspetos relacionados com as características inicias da dor: intensidade, o tipo de dor (dor neuropática tem maior risco de cronificação) ou o atraso no início de terapêutica analgésica.

A abordagem clínica de uma síndrome dolorosa deve iniciar-se pela colheita de uma história clínica detalhada, que deve incluir não só os antecedentes patológicos e medicação habitual, mas também o contexto familiar, as características sociais do doente e os seus hábitos pessoais, como o consumo tabágico, hábitos etílicos e toxicófilos. A dor tem de ser descrita tendo em conta a sua distribuição, podendo ser localizada, locorregional ou difusa, quento à sua forma de apresentação (súbita vs insidiosa), quanto à sua intensidade (utilizar escalas visuais analógicas de forma consistente) e às suas caraterísticas (em pontada, choque elétrico, moinha, em queimadura, etc.). O exame objetivo deve ser ao mesmo tempo sistematizado e direcionado à condição dolorosa, permitindo uma rentabilização temporal mantendo a assertividade necessária.

Após a colheita de história clínica e exame objetivo, o clínico deve ser capaz de diferenciar uma dor puramente nociceptiva de uma dor com características neuropáticas, que será de grande importância para a abordagem terapêutica da síndrome dolorosa. Por outro lado, deve ser capaz de estratificar o risco de cronificação da dor e atuar para o mitigar.


Bibliografia e referências: