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Que agravamento da função renal se pode esperar no início de terapêutica com i-SGLT2? E em quanto tempo é expectável que recupere?


Dra. Joana Pimenta | Medicina Interna

Hospital CUF Descobertas, Lisboa


O importante papel de proteção do declínio da função renal e de eventos renais dos i-SGLT2 em doentes diabéticos foi consubstanciado pelos ensaios de segurança cardiovascular (EMPA-REG outcome, CANVAS, DECLARE e VERTIS) e pelo ensaio CREDENCE em doentes com doença renal crónica e proteinúria.

Posteriormente, os resultados impressionantes de redução do risco de agravamento significativo da função renal, início de técnica de substituição da função renal, morte renal e morte cardiovascular do estudo DAPA-CKD com a dapagliflozina em doentes com doença renal crónica moderada a grave e albuminúria, independentemente de terem ou não diabetes, motivaram a sua interrupção precoce, por eficácia. Foi a primeira documentação do benefício dos i-SGLT2 em doentes com doença renal crónica proteinúrica sem diabetes mellitus. Esta classe constitui, assim, uma nova resposta a um grupo de doentes com poucas opções terapêuticas. Para além disso, tem um importante papel no tratamento da diabetes mellitus e da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida.

O início da terapêutica com i-SGLT2 pode levar a uma diminuição relativamente abrupta da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) nas primeiras semanas. Esse declínio, de cerca de 3–5 ml/min/1,73m2 documentado nos ensaios de segurança cardiovascular em diabéticos, é largamente reversível e resulta da ação natriurética da inibição do co-transportador de glicose e sódio (SGLT2). O consequente aumento do aporte de sódio ao túbulo distal (mácula densa) vai desencadear um mecanismo de feedback tubuloglomerular que leva a constrição da arteríola glomerular aferente, diminuindo a hiperperfusão e hiperfiltração glomerular. Esta redução da TFGe tem, portanto, origem hemodinâmica, partilhando semelhanças com o que acontece quando se inicia um inibidor da enzima de conversão ou um antagonista dos recetores da angiotensina 2, cujo papel nefroprotetor está estabelecido há muitos anos.

A este declínio inicial da taxa de filtração glomerular estimada segue-se uma recuperação e posterior estabilização da taxa de filtração glomerular estimada (a partir das 12 semanas no ensaio EMPA-REG outcome), sendo evidente nos vários ensaios clínicos que o uso de i-SGLT2 se associa a proteção renal, traduzida numa maior preservação da função renal e numa redução de eventos compostos renais (redução significativa da taxa de filtração glomerular estimada, início de técnica de substituição de função renal ou morte renal); para além disso, o uso de i-SGLT2 associou-se a menor ocorrência de lesão renal aguda em ensaios clínicos e estudos observacionais.

Assim, é expectável que exista uma diminuição da TFGe quando iniciamos a terapêutica com i-SGLT2 que deverá ser transitória, não sendo necessário adotar uma estratégia de avaliação precoce da função renal por esse motivo na grande maioria dos doentes; será de considerar uma vigilância mais apertada nalguns casos (por exemplo, se maior risco de hipovolemia, como nos doentes sob doses de diurético mais altas). Esse efeito na taxa de filtração glomerular estimada, desde que em limites razoáveis (que alguns autores sugerem até aos 30%) e de acordo com o bom julgamento clínico, não nos deve fazer suspender os fármacos, considerando os antecipados benefícios de proteção renal a longo prazo.